Conflitos no Cazaquistão deixam dezenas de mortos e mais de mil feridos
MUNDO
Publicado em 07/01/2022

O governo do Cazaquistão anunciou, nesta quinta-feira (6), que vai impor um limite ao preço dos combustíveis, após a onda de protestos contra o aumento que deixou dezenas de mortos e centenas de detidos em Almaty e que levou à mobilização de um contingente de tropas lideradas pela Rússia.

A mobilização começou a se espalhar no domingo por várias províncias deste país da Ásia central pelo aumento dos preços do gás e chegou a Almaty, a principal cidade do país, onde começou uma revolta. 

Segundo testemunhas, os manifestantes saquearam vários edifícios do governo na quarta-feira, incluindo o gabinete do prefeito e a residência presidencial. Os confrontos continuam nesta quinta.

No centro de Almaty, um correspondente da AFP ouviu rajadas de tiros vindas da sede da prefeitura, observou veículos carbonizados, edifícios do governo destruídos e carcaças nas ruas, após esta onda de distúrbios sem precedentes. 

Uma manifestante de 58 anos, que pediu anonimato, disse que houve confrontos perto da residência presidencial entre os manifestantes e a polícia, que disparava munição real. "Vimos pessoas mortas", contou à AFP. 

Diante da crescente pressão, o presidente do Cazaquistão, Kassym Jomart Tokayev, pediu ajuda para combater o que classificou como uma revolta de "grupos terroristas", que acusou terem recebido "treinamento no exterior". 

A vizinha Rússia e seus aliados da Organização do Tratado de Segurança Coletiva (OTSC) anunciaram nesta quinta-feira o envio ao Cazaquistão do primeiro contingente de uma "força coletiva de manutenção da paz". 

Para tentar amenizar a crise, o governo anunciou que imporia um limite aos preços do combustível, que estará em vigor por 80 dias para "estabilizar a situação socioeconômica".

Esta é a maior mobilização em décadas neste país que foi governado de 1989 até 2019 por Nursultán Nazarbáyev, considerado o mentor do atual presidente.

Tokayev tentou acalmar a situação anunciando a renúncia do gabinete, sem nenhum efeito. 

 

Mais de 2.000 detidos

Em Almaty, que é a capital econômica do país, centenas de pessoas foram detidas, informou o Ministério do Interior, citado pelas agências TASS e Ria Novosti. 

Segundo contas oficiais, mais de 1.000 pessoas ficaram feridas nos distúrbios e cerca de 400 estão hospitalizadas, 62 delas na UTI. 

Nesta quinta-feira, a polícia informou que "dezenas" de manifestantes morreram quando tentavam tomar prédios administrativos e delegacias. 

Além disso, 18 membros das forças de segurança morreram, dois deles encontrados decapitados e 748 ficaram feridos, segundo a televisão estatal.

 

Estado de emergência 

Para controlar a situação, o governo impôs um toque de recolher e declarou estado de emergência. 

As imagens divulgadas pelos jornais e pelas redes sociais mostravam cenas de caos, com lojas saqueadas e alguns prédios administrativos invadidos e incendiados em Almaty, enquanto se ouviam disparos de armas automáticas. 

No entanto, não existe um panorama completo da situação, já que há complicações nas comunicações, um bloqueio dos sinais de celulares, cortes da internet e de vários serviços de troca de mensagens. 

A porta-voz do Banco Central, Oljassa Ramazanova, anunciou a suspensão do trabalho de todas as instituições financeiras do país, onde a internet não funciona. 

Os aeroportos de Almaty, das cidades de Aktobe e Aktau e da capital Nursultán não estavam funcionando hoje após o cancelamento dos voos no dia anterior.

Como consequência do caos, o preço do urânio, do qual o Cazaquistão é um dos principais produtores mundiais, subiu bruscamente, enquanto os preços das empresas nacionais despencaram na bolsa de Londres. 

O país também é um centro de exploração de bitcoins, uma atividade que também está sofrendo uma forte queda. 

O ex-presidente Nursultán Nazarbáyev, de 81 anos, é alvo de parte da indignação dos manifestantes e em muitos protestos escuta-se o slogan "Fora velho!", em referência à sua influência na política. 

Reino Unido e França se uniram nesta quinta-feira aos apelos da UE, da ONU e de Washington, que pediram moderação. 

O chefe da diplomacia europeia Josep Borrell afirmou hoje que está 'muito preocupada' com a situação no país e com a presença de tropas estrangeiras. 

"Grande preocupação com a situação no Cazaquistão. A assistência militar estrangeira traz lembranças de situações que devem ser evitadas", escreveu Borrell no Twitter.

Os Estados Unidos pediram uma solução "pacífica" e a alta comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, pediu a todas as partes para "se absterem da violência".

O Cazaquistão, um país onde há pouca tolerância à oposição, é um aliado-chave da Rússia, mas também busca ter relações fluidas com o Ocidente e a China. 

É um importante exportador de petróleo e gás, portanto assinou contratos com gigantes da energia como a americana Chevron. 

Mas muitos opositores criticam que a corrupção generalizada faz com que esta riqueza não chegue às pessoas comuns, que vivem com um salário médio de menos de 600 dólares (530 euros). 

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