O governo ucraniano ironizou a fala da Rússia sobre a retirada de suas forças de Kiev e Chernihiv, no norte da Ucrânia ter sido um "gesto de boa vontade", pensando nas negociações entre os dois países.
"Não foi um gesto de boa vontade antes da próxima rodada de negociações, como as autoridades russas estão tentando apresentar. Foi um gesto da vontade de ferro de nosso exército, governo e todo o povo ucraniano", disse a vice-primeira-ministra da Ucrânia, Iryna Vereshchuk.
Ela pediu hoje que as populações do leste ucraniano, atual foco da guerra promovida pela Rússia, deixem a região. "É necessário agora, porque então as pessoas estarão sob fogo cruzado e ameaçadas de morte." O recado foi direcionado aos habitantes de Kharkiv, segunda maior cidade da Ucrânia, e das áreas separatistas, Lugansk e Donetsk. "Será quase impossível parar o fogo. É necessário evacuar enquanto houver essa possibilidade."
Hoje, a Rússia manteve ataques no leste da Ucrânia. Em uma das ações, um ponto de distribuição de ajuda humanitária foi atingido, matando ao menos duas pessoas, em Vuhledar, na região de Donetsk, área separatista. Segundo a administração militar da região, cinco pessoas ficaram feridas.
Nesta quarta (6), a guerra entrou em seu 42º dia. O governo russo disse que a retirada de seu exército das regiões de Kiev e Chernihiv, no norte da Ucrânia, foi um "gesto de boa vontade". Mas foi a partir da saída das forças russas que se verificou o massacre na cidade de Bucha, perto de Kiev, onde corpos foram encontrados pelas ruas. Hoje, o papa Francisco condenou o massacre e exibiu uma bandeira ucraniana que estava na cidade. A Rússia nega que tenha matado civis na região.
"Decidimos dar este passo como um gesto de boa vontade para criar condições favoráveis", disse o porta-voz do governo russo, Dmitry Peskov. "Podemos tomar decisões sérias durante as negociações e, portanto, o presidente Putin ordenou a retirada das tropas da região", completou.
Esforços no leste
O governo ucraniano ainda considera que "os principais esforços do inimigo estão focados na preparação de uma operação ofensiva que visa estabelecer o controle total sobre o território das regiões de Donetsk e Lugansk", área separatistas.
A Ucrânia relata que os russos "infligem danos de fogo em instalações de defesa, infraestrutura logística e áreas residenciais das cidades".
No relatório de hoje, o Ministério da Defesa da Rússia disse que atingiu bases de armazenamento de combustível que serviam às forças ucranianas nas regiões de Kharkiv, Mykolaiv e das áreas separatistas.
Os russos também apontam que destruíram equipamentos de defesa da Ucrânia entre ontem e hoje, como o sistema de mísseis antiaéreos e depósitos das Forças Armadas.
Governador de Lugansk, Sernii Gaidai, porém, disse que, na noite de ontem e na última madrugada, cidades da região foram alvo de 81 ataques de forças russas, danificando "infraestruturas civis e meios de subsistência, bem como edifícios privados e arranha-céus".
Bombas e foguetes caíam em intervalos regulares nesta quarta-feira na cidade industrial de Severodonetsk, que fica na região de Lugansk. Com mais de 100.000 habitantes antes da guerra, Severodonetsk é a maior cidade do leste sob controle do exército ucraniano, perto da linha de frente com os territórios separatistas pró-Rússia.
As autoridades da região leste de Lugansk pediram aos civis que se retirem "enquanto for seguro", alertando que os bombardeios russos podem cortar as rotas de fuga.
Em Mariupol, cidade portuária que fica na região de Donetsk, o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, disse que "ataques aéreos, bombardeios continuam". "Não há um único prédio em Mariupol, nenhum prédio intacto", completou, dizendo que o governo é incapaz de indicar, no momento, quantas pessoas foram mortas na cidade em razão da atuação das forças russas.
Ataque aéreo
Seis tanques de combustível e de lubrificantes ficaram destruídos em Novomoskovsk, no leste da Ucrânia, após um ataque com foguetes, segundo autoridades locais. "A noite foi alarmante e difícil. O inimigo atacou nossa região pelo ar", disse Valentyn Reznichenko, chefe da administração militar da região de Dnipropetrovsk.
Moldávia
O Ministério da Defesa da Ucrânia está com a atenção voltada para o sul do país e para a fronteira com a Moldávia, país vizinho. Segundo relatório do ministério nesta quarta, as forças da Rússia "tentando melhorar a situação tática na direção".
"Os preparativos para o recebimento de aeronaves estão sendo realizados no aeródromo de Tiráspol", disse o relatório, citando cidade da Moldávia que fica a cerca de 20 quilômetros da fronteira com a Ucrânia. Odessa, principal cidade da região, está a cerca de 120 quilômetros. Para a Defesa ucraniana, o uso do território da Moldávia "para apoiar a operação ofensiva nesse sentido não está descartado".
Hoje, a administração militar da região de Odessa disse que "o inimigo ativou o reconhecimento aéreo" da área. "A noite passada em Odessa e na região foi relativamente calma, embora as sirenes de ataque aéreo tenham soado, pois o inimigo está intensificando o reconhecimento aéreo. Mas nossas forças de defesa aérea estão trabalhando e realizando operações de defesa", disse o porta-voz, Serhii Bratchuk.
Sanções e inquisição
A Rússia, por sua vez, mantém o tom de reclamação contra as sanções aplicadas por países em razão do conflito que promove na Ucrânia. Ex-presidente da Rússia e atual vice-presidente do Conselho de Segurança do país, Dmitri Medvedev comparou às sanções à Inquisição. "Eles mesmos fizeram a acusação, eles mesmos torturaram, eles mesmos proferiram a sentença, eles mesmos queimaram o herege."
Para ele, "a luta contra a Rússia é realizada apenas com base nas emoções, sem levar em conta o bom senso e até mesmo o Direito".
"Nossos oponentes, convenhamos, os inimigos da Rússia, que buscam com tanta veemência 'cancelar' a propriedade de empresas russas, devem entender que enfrentarão muitos processos nos tribunais. Tanto nos tribunais nacionais dos Estados Unidos e da Europa, como nos tribunais internacionais", disse Medvedev. "Aqui será possível verificar o que a alardeada máquina de justiça ocidental vai apoiar: o roubo dos inquisidores ou as justas exigências dos donos."
País aliado dos russos, a China pediu o fim das sanções para que a situação na Ucrânia possa ser resolvida.
Papa e a bandeira de Bucha
O papa Francisco condenou hoje "o massacre de Bucha" e ergueu uma bandeira ucraniana enviada a ele da cidade. "As notícias recentes da guerra na Ucrânia, em vez de trazer alívio e esperança, trouxeram novas atrocidades, como o massacre de Bucha", disse ele ao final de sua audiência semanal no auditório do Vaticano.
"Crueldade cada vez mais horrenda, mesmo contra civis, mulheres e crianças indefesas. São vítimas cujo sangue inocente clama aos céus e implora: 'Pare esta guerra! Deixe as armas calarem!'", disse.
"Ontem, precisamente de Bucha, eles me trouxeram esta bandeira", disse ele, desdobrando-a e erguendo-a para o público de vários milhares, que irrompeu em aplausos. A bandeira parecia escurecida e manchada e tinha algo escrito nela.
Durante a audiência, Francisco também lamentou a "impotência das organizações internacionais" diante do conflito. "Após a Segunda Guerra Mundial tentamos estabelecer as bases de uma nova história de paz, mas infelizmente a antiga história das potências rivais se perpetua. E na atual guerra na Ucrânia, somos testemunhas da impotência das organizações internacionais", disse o pontífice, que já se declarou disposto a visitar Kiev.
Mísseis perto da Polônia
Dois mísseis foram derrubados pela Ucrânia em Radekhiv, cidade no oeste do país, que fica a cerca de 60 quilômetros da fronteira com a Polônia. "Os destroços caíram nos arredores da cidade, resultando em 3 explosões em uma infraestrutura civil não utilizada", disse Maksym Kozytskyi, governador de Lviv.
Segundo Kozytskyi, as Forças Armadas da Ucrânia indicaram que os mísseis foram disparados por caças que estavam em Belarus.