Deram o que falar as recentes declarações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em entrevista à revista Time, sobre culpa do presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, na guerra da Ucrânia. "Esse cara é tão responsável quanto o Putin, porque numa guerra não tem apenas um culpado", disse Lula.
O ex-presidente propõe uma falsa simetria. Igor Gielow diz que Lula ampliou seu repertório de erros. Já Kennedy Alencar considera correta a fala do petista. Anatoliy Tkach, embaixador da Ucrânia no Brasil, considerou que o ex-presidente está "mal informado".
Desde o início da invasão russa até então, Lula havia feito afirmações contrárias ao conflito —que já dura mais 70 dias, causou a morte de centenas de civis e obrigou que mais de 10 milhões de pessoas deixassem suas casas, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU).
Atual líder nas pesquisas eleitorais rumo ao Planalto, o petista chegou a defender que a guerra fosse resolvida com diplomacia e intervenção da ONU, caso, segundo ele, o órgão internacional gozasse de mais representatividade. Também disse que, se estivesse no lugar do presidente, teria feito algo para ajudar a evitar o conflito.
Em segundo lugar na corrida eleitoral, Jair Bolsonaro (PL), por sua vez, tem mantido uma postura de suposta isenção quando solicitado a se manifestar a respeito da guerra.
Às vésperas da invasão da Ucrânia, em fevereiro, o presidente externou solidariedade à Rússia ao se encontrar com o presidente russo no Kremlin. O alinhamento com Vladimir Putin gerou ruído e uma reação incisiva dos Estados Unidos, que colocaram o Brasil "do outro lado em que a maioria da comunidade global está".
Pouco depois, com o início da guerra, Bolsonaro modulou o discurso —mas a alegada neutralidade em favor de interesses econômicos ficou dúbia.
Ele desautorizou, por exemplo, o vice Hamilton Mourão a se manifestar sobre o tema, depois que o militar afirmou que o Brasil não era neutro no conflito e não concordava com a invasão ao território ucraniano.
Apesar da reprimenda —e diferentemente de Lula—, Bolsonaro nunca condenou a guerra de forma contundente, embora tenha pregado a "paz mundial".
No campo diplomático, o governo brasileiro rechaça a investida do Exército russo, o que tem ocorrido por meio de votações na ONU.
Um dia após Putin anunciar o envio de tropas no que chamou de "operação militar especial", o Itamaraty divulgou nota desaprovando o conflito: "[O Brasil] apela a todas as partes envolvidas para que evitem uma escalada de violência e que estabeleçam, no mais breve prazo, canais de diálogo capazes de encaminhar de forma pacífica a situação no terreno."
A seguir, relembre o que Bolsonaro e Lula já disseram sobre a guerra da Ucrânia:
Jair Bolsonaro
"Estou muito feliz e honrado pelo seu convite. Somos solidários à Rússia e temos muito a colaborar em várias áreas", durante encontro com Putin, em Moscou, em 16 de fevereiro.
"A gente pede a Deus que tenhamos paz na região. Até falei lá que o mundo é a nossa casa e Deus está acima de todos. Falei a mensagem de paz. Não fomos para tomar partido de ninguém", após ter retornado da viagem à Rússia, em 18 de fevereiro.
"Não podemos interferir. Nós queremos a paz, mas não podemos trazer consequências para cá", em 27 de fevereiro.
"Você está exagerando a palavra massacre. Não há interesse por parte de um chefe de Estado praticar um massacre por onde quer que seja, está se empenhando em duas regiões do sul da Ucrânia."
"Vamos resolver o assunto, mas não vai ser na pancada. Afinal você está tratando com uma das maiores potências nucleares do mundo. Essas coisas não se resolvem com soco na mesa", em 1º de março.
"Muita gente questiona que o presidente precisa ter uma posição mais firme de um lado ou de outro. O Brasil continua numa posição de equilíbrio. Nós temos negócios com os dois países. Não temos a capacidade de resolver esse assunto. Então o equilíbrio é a posição mais sensata por parte do governo federal", em 3 de março.
"Nessa guerra lá fora queriam que eu tomasse partido, meu partido é o Brasil. Temos negócios com a Rússia, somos neutros e continuamos recebendo fertilizantes deles. Imaginem o nosso agronegócio sem fertilizante. Cairia a produtividade", em 12 de abril.
"Lamentamos todas as mortes ocorridas, mas não podemos trazer problema para nosso país", em 30 de março.
"A razão dessa guerra, por tudo o que eu compreendo, que eu leio e que eu escuto, seria resolvida aqui no Brasil em uma mesa tomando cerveja. Teria sido resolvido aqui, senão na primeira cerveja, na segunda. Se não desse na segunda, na terceira. Se não desse na terceira, até acabarem as garrafas a gente ia fazer um acordo de paz", no dia 2 de maio, foi uma ironia a uma declaração feita por Lula (leia abaixo).
"O que nós tememos obviamente é o prolongamento dessa guerra, que sinaliza com mais inflação para o mundo, e vem da energia, vem dos combustíveis. Eu peço a todos cada vez mais resiliência, cada vez mais garra, determinação", em 4 de maio.
Lula
"É lamentável que, na segunda década do século 21, a gente tenha países tentando resolver suas divergências, sejam territoriais, políticas ou comerciais, através de bombas, tiros, ataques, quando deveria ter sido resolvido numa mesa de negociação", em 24 de fevereiro.
"Ele [Bolsonaro] foi lá [na Rússia] e tentou passar para a sociedade que foi para uma missão. Ou seja, até hoje a gente não sabe o que ele foi fazer lá. Mas, de qualquer forma, essa questão da guerra é uma coisa delicada, é uma coisa complicada, que a gente não pode aceitar isso", em 1º de março.
"A América Latina tem que estar unida nesse esforço para um mundo que quer paz e não aguenta mais a guerra", em 1º de março.
"O mundo está precisando de paz, o mundo está precisando de amor, o mundo está precisando de compreensão, o mundo está precisando de fraternidade. Governantes, baixem as armas, sentem na mesa de negociação e encontrem a solução para o problema que levou vocês ao começo de uma guerra", em 2 de março.
"É inadmissível que um país se julgue no direito de instalar bases militares em torno de outros países. É absolutamente inadmissível que um país reaja invadindo outro país", em 3 de março.
"Eu não posso concordar com a invasão da unidade territorial de outro estado. Eu lamento profundamente a Rússia ter invadido a Ucrânia. Mas é importante eu lembrar que tem muita gente envolvida [nessa guerra]. Por que a Europa não tomou uma atitude? Por que o Biden não tomou uma atitude? Por que queriam obrigar o Putin a aceitar a Otan se, em 1961, os EUA não aceitaram que a Rússia colocasse míssil em Cuba e, por isso, evitou a terceira guerra mundial?", em 26 de março.
"O povo quer paz, o povo precisa de paz. A quem interessa essa guerra? Aqui no Brasil, a gente conversaria com cerveja, numa mesa de bar. Se não fosse na primeira cerveja, seria na segunda, ou até a caixa acabar", em 30 de março.
"Ninguém deve acreditar que a gasolina está cara por causa da guerra na Ucrânia. Ninguém deve acreditar quando o presidente fala 'se eu pudesse eu dava um murro na mesa e consertava tudo'. Ele está mentindo, ele pode consertar. É só ele reunir o conselho da Petrobras, a Comissão Nacional de Política Energética e dizer que não queremos o preço dolarizado", em 31 de março.
"O bloqueio é uma arma de guerra tão poderosa quanto a bomba atômica, porque ele não está prejudicando o russo, não está prejudicando os EUA. No nosso caso aqui, do Brasil, da América Latina, está bloqueando quase todos os países, não só por conta do preço do petróleo, mas por conta dos fertilizantes e da proibição de vendê-los", em 5 de abril.
"Vamos tentar recuperar os Brics. Só basta que você mande o Putin parar com essa guerra", em 30 de abril.