As misteriosas crateras que ameaçam 'engolir' moradores de vilarejos da Croácia
MUNDO
Publicado em 02/09/2022

Aconteceu de repente e sem aviso prévio. Onde deveriam ter nascido os primeiros brotos de batata atrás do pomar, no espaçoso jardim de Nikola Borojević, havia agora um enorme buraco.

Com 30 metros de largura e 15 metros de profundidade, ele rapidamente se encheu de água. E não foi o único.

 

No espaço de algumas semanas, dezenas de buracos parecidos se abriram ao redor dos vilarejos Mečenčani e Borojovići, no nordeste da Croácia.

 

O que estava do lado de fora da casa de Borojević, em Mečenčani, apareceu em 5 de janeiro, apenas seis dias depois de um terremoto de magnitude 6,4 atingir a área em torno da cidade vizinha de Petrinja.

 

Foi o terremoto mais forte que atingiu a Croácia em mais de quatro décadas, matando sete pessoas e destruindo milhares de casas.

 

Embora se saiba que deslizamentos e crateras podem ser causados ​​por terremotos, assim como outros fenômenos geológicos estranhos, como liquefação — quando o solo sólido começa a se comportar como líquido —, o grande número de buracos que apareceram nos vilarejos surpreendeu e intrigou os especialistas.

 

Um mês após o terremoto, havia quase 100 crateras espalhadas por uma área de 10 km², com novos buracos se abrindo a cada semana.

 

O buraco no jardim de Borojević é agora o maior da área. Quando apareceu, tinha 10 metros de largura, mas começou a crescer quase imediatamente.

 

 

"Minha esposa ficou em casa a manhã toda, olhando de vez em quando pela janela", conta Borojević. "Por volta das 14h, ela notou algo estranho no jardim. Saímos e havia um buraco enorme em nosso pomar."

 

 

Nos três meses seguintes, o buraco triplicou de tamanho. Mas os Borojevićs tiveram sorte.

Outras crateras na região foram abertas a poucos metros da entrada das casas dos moradores, e uma delas apareceu embaixo de uma residência, levando as autoridades a considerar desocupar ambos os vilarejos.

 

Outros buracos surgiram em florestas e campos agrícolas adjacentes, onde um deles, de acordo com rumores locais, quase engoliu um fazendeiro e seu trator.

 

O número excepcionalmente alto de crateras num único lugar chamou a atenção de geólogos locais e estrangeiros, ansiosos para entender como o terremoto pode ter levado ao colapso do solo.

 

"Ninguém esperava o aparecimento de tantas crateras", conta o sismólogo Josip Stipčević, do Departamento de Geofísica da Faculdade de Ciências de Zagreb, capital croata.

 

Intensa atividade sísmica

 

 

A Croácia está localizada em uma área de intensa atividade sísmica, na qual a pequena placa tectônica do Adriático colide com a placa da Eurásia, causando uma série de falhas ativas, explica Stipčević.

 

Antes do terremoto de 29 de dezembro de 2020, o país havia sido atingido por outros nove tremores, com magnitude superior a 6, desde o início do século 20.

 

O último grande terremoto que havia acontecido na falha tectônica Pokupsko-Petrinja — ao longo da qual ocorreu o mais recente — foi em 1909.

 

O abalo de 1909 ocorreu a apenas 23 km a noroeste do epicentro daquele que fez a terra tremer no fim de 2020. E também atraiu a atenção dos sismólogos da época.

 

O renomado geofísico croata Andrija Mohorovičić analisou os sismógrafos do terremoto de 1909 em Pokupsko e concluiu que as ondas sísmicas viajam a velocidades diferentes conforme passam por diferentes camadas da Terra.

 

Sua observação levou à descoberta de uma camada intermediária que separa a crosta terrestre do manto, conhecida hoje como descontinuidade de Mohorovicic, ou simplesmente Moho.

 

Atualmente, pesquisadores estão estudando a mesma região na esperança de entender como o terremoto fez com que tantos buracos aparecessem repentinamente.

 

As crateras não são a consequência mais comum de abalos sísmicos fortes, mas podem surgir, especialmente em áreas com cavidades subterrâneas ocultas.

 

Após o devastador terremoto perto da cidade italiana de Áquila, em 2009, dois buracos se abriram imediatamente nas estradas da parte antiga da cidade.

 

Os especialistas suspeitaram na época que uma escavação anterior de fossas verticais para um canal de esgoto havia enfraquecido a cobertura da caverna subterrânea, contribuindo para o colapso.

 

 

"A verdadeira anomalia no caso da Croácia é um número muito elevado de crateras com dimensão significativa", diz o geólogo italiano Antonio Santo, da Universidade de Nápoles Federico II, na Itália.                     

 

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