União Europeia, Estados Unidos, Reino Unido, Rússia e China pediram nesta quarta-feira calma aos envolvidos e o fim dos ataques
No total, ao menos 72 pessoas morreram desde segunda-feira (10) -65 em Gaza, segundo o Ministério da Saúde local, e 7 em Israel, de acordo com autoridades médicas israelenses.
Entre as vítimas, há 17 crianças, sendo 16 palestinos e um garoto israelense de 5 anos que morreu nesta quarta após a casa onde ele morava na região metropolitana de Tel Aviv ter sido atingida por um foguete do Hamas.
A espiral de violência acendeu o alerta da comunidade internacional, que tenta apaziguar a situação e impedir que a nova fase do conflito leve a uma guerra aberta entre os dois lados. Por isso, União Europeia, Estados Unidos, Reino Unido, Rússia e China pediram nesta quarta-feira calma aos envolvidos e o fim dos ataques.
Não há, porém, um consenso de quais devem ser os próximos passos, principalmente porque alguns países -como EUA e Alemanha- são mais próximos dos israelenses, enquanto outros -principalmente nações de maioria muçulmana, como Paquistão e Turquia- apoiam a causa palestina.
Nesta quarta, por exemplo, o governo americano bloqueou um comunicado negociado dentro do Conselho de Segurança da ONU (que é formado por 15 países) que pedia que os dois lados recuassem na atual disputa. A nota pedia, entre outros pontos, que Israel respeitasse a lei internacional, interrompesse a construção de assentamentos em territórios ocupados e se comprometesse a não realizar despejos de palestinos que vivem em Jerusalém Oriental -tema que está no centro da atual onda de violência.
Em uma das poucas medidas concretas anunciadas nesta quarta, o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, enviou seu principal diplomata para a região, Hady Amr, para negociar com os dois lados uma solução que ponha fim à violência. A declaração aconteceu depois de as principais companhias aéreas americanas cancelarem todos os seus voos para Tel Aviv devido aos confrontos.
Durante o início da noite, o presidente Joe Biden conversou por telefone com o premiê israelense, Binyamin Netanyahu. Na ligação, o americano apoiou o direito de Israel de se defender dos foguetes do Hamas, mas pediu calma para que a situação fosse resolvida rapidamente, de acordo com comunicado da Casa Branca.
Em outra frente diplomática, o governo russo pediu que o chamado quarteto do Oriente Médio -um fórum que reúne Moscou, Washington, ONU e União Europeia- seja reativado para buscar o fim dos conflitos.
Apesar dos pedidos internacionais por paz, as manifestações de representantes do governo de Israel e do Hamas indicam que a violência deve continuar. "Este é apenas o começo. Vamos atingi-los como nunca sonharam ser possível", disse Binyamin Netanyahu, em um comunicado.
O Hamas, por sua vez, confirmou, "com orgulho, coragem e desafio", a morte de Bassem Issa, um de seus comandantes, e disse que as baixas no alto escalão não os acovardarão. Pelo contrário, o grupo disse que milhares de soldados seguirão os passos dos membros mortos e se referiu aos "líderes martirizados" como "combustível para nosso projeto de libertar nossa terra".
Nesta quarta, Israel realizou centenas de ataques aéreos em Gaza e disse que a ofensiva matou ao menos 16 líderes de inteligência e membros da ala militar do Hamas, como parte de uma nova e extensa série de operações contra membros do alto escalão da facção considerada terrorista por EUA, União Europeia e, claro, Israel. Os aviões de guerra teriam mirado ainda locais que os militares disseram ser pontos de lançamento de foguetes, além de escritórios e residências de outras lideranças do grupo islâmico.
Do outro lado, os militantes da facção disseram ter disparado ao menos 220 foguetes contra as cidades de Tel Aviv e Berseba durante a noite de terça e a madrugada de quarta. A operação aconteceu em resposta à destruição de um prédio de 13 andares no centro de Gaza, no qual as principais figuras do Hamas mantinham escritórios. Segundo testemunhas, o edifício havia sido evacuado antes do ataque, mas o grupo não deixou claro se houve vítimas. O Hamas também relatou a destruição da sede da polícia palestina e de um prédio no centro da cidade que abrigava residências, lojas e uma TV local.
"Israel enlouqueceu", disse à agência de notícias Reuters um homem em uma rua de Gaza, onde as pessoas saíram correndo de suas casas para tentar se proteger das explosões. Em Tel Aviv, também houve correria e moradores insones que buscavam segurança em abrigos antiaéreos públicos ou em espaços de paredes reforçadas obrigatórios em todas as construções desde 1991.
Imagens publicadas nas redes sociais mostraram o céu de Tel Aviv repleto de mísseis sendo interceptados pelo sistema de defesa israelense, ao som de sirenes de alerta. "As crianças escaparam do coronavírus e, agora, [enfrentam] um novo trauma", disse a uma emissora de TV local uma mulher israelense na cidade de Ashkelon, também alvo dos disparos do Hamas.
A sensação de insegurança também se espalhou por outras regiões do país, com confrontos civis entre a minoria árabe-israelense e judeus. Em Lod, o prefeito disse estar à beira de uma guerra civil e decretou estado de emergência após uma pessoa morrer, 11 ficarem feridas e 20 serem detidas em três dias.
Na cidade de Bat Yam, ao sul de Tel Aviv, grupos extremistas judeus realizaram nesta quarta uma marcha durante a qual atacaram lojas de árabes. A TV israelense exibiu um vídeo que mostra o momento no qual a multidão ataca um motorista palestino -não há informações sobre seu estado de saúde.
Já em Acre, um homem judeu de 30 anos está em estado grave depois de ter sido apedrejado por manifestantes árabes. Cidades como Haifa, Jafa e Nazaré também têm sido palco de manifestações da população árabe em apoio à causa palestina, e a polícia prendeu dezenas de pessoas.
A situação fez o rabino Yitzhak Yosef, uma das maiores autoridades religiosas do país, emitir um raro comunicado público pedindo o fim da violência. "A Torá de Israel não autoriza ninguém a fazer justiça com as próprias mãos ou a agir com violência", afirmou.
De acordo com o ministro da Defesa de Israel, Benny Gantz, em entrevista coletiva nesta quarta, o clima de guerra deve se prolongar pelos próximos dias, e os militares israelenses "continuarão atacando e proporcionarão um silêncio total e duradouro". "Só quando atingirmos essa meta poderemos falar sobre acalmar a situação. No momento, não há data para o fim."
Em Gaza, o líder do Hamas, Ismail Haniyeh, disse que se as forças israelenses quiserem manter a escalada de violência, a resistência do grupo está pronta para responder à altura. Ao mesmo tempo, representantes do grupo informaram ao governo russo que estão dispostos a implementar um cessar-fogo, desde que Israel faça o mesmo.
A nova fase de hostilidades entre Israel e Hamas, que inclui os bombardeios mais significativos desde a guerra de 2014 no enclave, foi desencadeada por confrontos que já duram seis dias entre palestinos e forças de segurança israelenses na mesquita de Al-Aqsa, em Jerusalém.
A cidade, sagrada para judeus, palestinos, cristãos e muçulmanos, vive um estado de tensão desde o início do ramadã, mês mais importante para a tradição religiosa islâmica.
O Hamas, grupo radical islâmico que comanda desde 2007 a região da Faixa de Gaza, rivaliza com o Fatah, que controla a Cisjordânia e a ANP (Autoridade Nacional Palestina) -tradicionalmente reconhecida internacionalmente como representante oficial dos palestinos. Entre a deácada de 1960 e o início dos anos 1990, o Fatah era considerado o principal grupo palestino e entrou diversas vezes em confrontos contra Israel. Nos últimos 30 anos, porém, a correlação de forças mudou, e o Hamas passou a liderar as ofensivas contra o país vizinho, com a ANP diminuindo a participação em ações violentas.
No centro dos atuais conflitos estão a liberdade de culto em pontos da região de Jerusalém conhecida como Cidade Antiga -que os palestinos dizem estar sendo tolhida- e uma decisão judicial que prevê o despejo de famílias palestinas do bairro de Sheikh Jarrah que, por veredito de um tribunal regional, devem devolver os terrenos a judeus.
Pela lei de Israel, se judeus provarem que suas famílias viviam em Jerusalém Oriental antes de 1948, eles podem pedir a restituição de seus direitos de propriedade. A regra é contestada pelos palestinos, e o governo de Israel argumenta que eles estão "tratando uma disputa imobiliária entre partes privadas como uma causa nacionalista, para incitar violência".
Jerusalém é crucial para o conflito israelense-palestino. De um lado, Israel reivindica a cidade inteira, incluindo seu setor oriental capturado na guerra de 1967, como sua capital. Os palestinos, do outro, buscam fazer de Jerusalém Oriental a capital de um futuro Estado na Cisjordânia e em Gaza.
REPERCUSSÃO
Estados Unidos
A Casa Branca disse que Israel tem o direito legítimo de se defender dos ataques de foguetes do Hamas, mas ponderou que Jerusalém "deve ser um lugar de coexistência". A porta-voz da Casa Branca, Jen Psaki, afirmou que o apoio do presidente Joe Biden à "segurança de Israel, por seu direito legítimo de se defender e a seu povo, é fundamental e nunca vai vacilar".
China
O enviado especial da China ao Oriente Médio, Zhai Jun, expressou "profunda preocupação" com a escalada dos confrontos entre palestinos e Israel e pediu a todas as partes que exerçam moderação para evitar mais baixas. Segundo ele, Pequim continuará pressionando o Conselho de Segurança da ONU a tomar medidas sobre a situação em Jerusalém Oriental o mais rapidamente possível, de acordo com um comunicado do Ministério das Relações Exteriores.
União Europeia
O bloco europeu disse que os ataques de foguetes palestinos contra Israel são "totalmente inaceitáveis" e pediu a todas as partes que visem uma redução da escalada e evitem mais vítimas civis. O chefe de política externa da UE, Josep Borrell, também condenou os despejos de famílias palestinas em Jerusalém Oriental, chamando-os de ilegais e dizendo que só serviram para alimentar tensões.
Organização das Nações Unidas
O porta-voz do secretário-geral da ONU, António Guterres, disse que ele estava entristecido pelo número cada vez maior de vítimas, incluindo crianças dos dois lados do conflito. "As forças de segurança israelenses devem exercer o máximo de contenção e calibrar o uso da força. O lançamento indiscriminado de foguetes e morteiros contra centros populacionais israelenses é inaceitável", disse o porta-voz da ONU, Stéphane Dujarric.
Embaixada de Israel no Brasil
"O Hamas comete um duplo crime de guerra ao disparar foguetes contra civis inocentes de Israel, e também ao fazê-lo de áreas civis de Gaza, colocando em risco sua própria população."
Confederação Israelita do Brasil
"Israel é novamente vítima de ataques terroristas contra sua população civil. Grupos terroristas como Hamas e Jihad Islâmica lançaram já centenas de foguetes contra civis inocentes em território israelense, causando mortes e feridos. Diante de ataques indiscriminados contra a sua população e o seu território, Israel obviamente tem o direito e o dever de se defender com toda a força. É o que qualquer país do mundo faria."
Federação Israelita do Estado de São Paulo
"Não temos dúvidas que tudo isso é motivado propositalmente pelo terrorismo do Hamas, que se aproveita de qualquer data ou situação para causar tensão, provocar a reação israelense e transformar a vítima em culpada por supostos ataques desproporcionais. Israel vive há muitos anos sob ameaça de terrorismo. Para se alcançar a paz duradoura, é necessário respeitar o direito do outro de existir. Quando a rede de terrorismo do Hamas consegue chegar à população de Israel, vem a resposta. Israel não vai matar crianças, Israel vai destruir foguetes para defender seus cidadãos."
Boris Johnson, primeiro-ministro do Reino Unido
"Estou exortando Israel e os palestinos a recuarem, e ambos os lados a mostrarem moderação. O Reino Unido está profundamente preocupado com a crescente violência e o número de vítimas civis, e queremos ver uma redução urgente das tensões."
Heiko Maas, ministro das Relações Exteriores da Alemanha
"O lançamento de foguetes contra Israel é absolutamente inaceitável e deve ser interrompido imediatamente. Nesta situação, Israel tem direito à legítima defesa. Esta escalada de violência não deve ser tolerada nem aceita."
Liga Árabe
Ahmed Aboul Gheit, líder do fórum diplomático que reúne 22 Estados árabes, disse que os ataques aéreos israelenses foram "indiscriminados e irresponsáveis". Ele acusou Israel de ser responsável pela "escalada perigosa" em Jerusalém e exortou a comunidade internacional a agir imediatamente para interromper a violência.
Aiatolá Ali Khamenei, líder supremo do Irã
"O comportamento malicioso dos sionistas está sendo visto pelos olhos das pessoas do mundo. É dever de todos condenar esse comportamento malicioso, criminoso e bárbaro dos sionistas nos últimos dias. Os palestinos estão acordados e determinados. Eles devem continuar neste caminho. Só se pode falar com a linguagem do poder com esses criminosos. Eles devem aumentar sua força, permanecer firmes, enfrentar o inimigo e forçá-los a parar seus crimes."
Turquia
"O governo israelense deve finalmente entender que não será capaz de suprimir os direitos e as demandas legítimas do povo palestino usando poder indiscriminado e desproporcional", afirmou o Ministério das Relações Exteriores turco.
Organização pela Cooperação Islâmica
A OIC "elogiou a firmeza do povo palestino locado na cidade ocupada de Jerusalém e sua resposta aos ataques israelenses aos locais sagrados".
Comitê Internacional da Cruz Vermelha
O diretor da instituição para o Oriente Médio, Fabrizio Carboni, disse que o direito internacional humanitário proíbe ataques indiscriminados contra civis, que qualquer ataque deve ser proporcional e que todas as precauções necessárias devem ser tomadas para evitar vítimas civis. Ele pediu "movimento rápido, seguro e desimpedido para ambulâncias" e para funcionários e voluntários dos serviços médicos palestinos e israelenses.
Tribunal Penal Internacional
A procuradora-geral Fatou Bensouda disse que o TPI está monitorando os acontecimentos, preocupado com a possibilidade de crimes de guerra estarem sendo cometidos na Cisjordânia, incluindo Jerusalém Oriental, e dentro e ao redor de Gaza.
COMO FORAM OS ÚLTIMOS CONFRONTOS ENTRE ISRAEL E GRUPOS PALESTINOS
23 e 24.fev.20 Soldados israelenses acusaram um grupo de palestinos de tentar instalar um explosivo na cerca que separa Israel da Faixa de Gaza, o que gerou um conflito entre os dois lados. Em resposta, o grupo radical Jihad Islâmica disparou em um intervalo de 48 horas cerca de cem foguetes contra a região sul de Israel -que respondeu com bombardeios que deixaram quatro palestinos feridos.
3 a 6.mai.19 Depois de dois soldados israelenses que estavam próximos da divisa ficarem feridos por tiros disparados de Gaza, Israel fez um ataque contra alvos do Hamas na região. Em resposta, foram disparados 690 foguetes de Gaza contra Israel, sendo que 240 foram interceptados pelo sistema de defesa antiaérea. O confronto terminou com 25 mortos do lado palestino -incluindo duas mulheres grávidas e duas crianças- e 4 do lado israelense.
25 a 27.mar.19 Um foguete disparado da Faixa de Gaza destruiu uma casa na vila de Mishmeret, que fica ao norte de Tel Aviv, deixando sete israelenses feridos. O premiê Binyamin Netanyahu ordenou, então, o bombardeio de áreas do Hamas, que disparou foguetes contra a cidade de Ashkelon, no sul de Israel. A violência acabou depois de quase uma semana de confronto.
11 a 13.nov.18 Um homem de 40 anos morreu depois que um foguete atingiu sua casa em Ashkelon. Em resposta, equipes das Forças Especiais de Israel realizaram ações na Faixa de Gaza -sete palestinos e um agente israelense foram mortos. Na sequência, grupos de Gaza dispararam foguetes contra Israel que deixaram 53 feridos. As Forças Armadas israelenses, então, bombardearam Gaza, causando três mortos.
8 e 9.ago.18 O governo israelense chegou a cogitar uma ação terrestre em Gaza depois que o lançamento de quase 180 foguetes da região deixou mais de uma dezena de feridos. No fim, porém, Israel optou por um bombardeio contra 150 alvos, que deixou três palestinos mortos, incluindo um bebê.
jul. e ago.14 Integrantes do Hamas sequestraram e mataram três adolescentes israelenses em junho, em ação que deu início ao maior conflito dos últimos sete anos. Em resposta, Israel lançou uma ação contra alvos do grupo na Cisjordânia. Na sequência, tropas do Exército israelense entraram na Faixa de Gaza, em uma escalada do conflito, que se estendeu por sete semanas. Durante esse período, o Hamas e outros grupos lançaram 4.562 foguetes contra Israel, que revidou com ataques contra 5.262 alvos palestinos. Quando enfim os dois lados chegaram a um cessar-fogo, no fim de agosto, mais de 70 israelenses e 2.100 palestinos tinham morrido.