O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria nesta quarta-feira (11) para revisar o Marco Civil da Internet e ampliar a responsabilização das plataformas digitais por conteúdos ilegais publicados por seus usuários. A decisão, que ainda aguarda votos finais, representa uma mudança significativa no ambiente digital brasileiro e promete afetar diretamente o funcionamento das grandes empresas de tecnologia, as chamadas big techs.
Atualmente, o artigo 19 do Marco Civil da Internet determina que as plataformas só podem ser responsabilizadas caso descumpram uma ordem judicial para remover conteúdo ilícito. Na prática, isso significa que Facebook, Google, X (antigo Twitter) e outras redes sociais não são punidas por manter postagens ofensivas, extremistas ou criminosas enquanto não houver decisão da Justiça. O entendimento da maioria dos ministros, porém, é de que esse modelo se tornou insuficiente diante do avanço das redes sociais e da disseminação de conteúdos que atentam contra a democracia, a segurança e a integridade de crianças e adolescentes.
O ministro Flávio Dino, ao apresentar seu voto, defendeu que “liberdade sem responsabilidade é tirania” e propôs que as plataformas passem a responder civilmente se não removerem conteúdos manifestamente ilegais após notificação extrajudicial — ou até mesmo sem notificação, em casos de crimes graves como pornografia infantil, terrorismo, instigação ao suicídio e ataques ao Estado Democrático de Direito. Dino sugeriu ainda que a responsabilização não se aplique a opiniões individuais não impulsionadas, preservando a liberdade de expressão em debates legítimos.
Outros ministros, como Dias Toffoli, Luiz Fux, Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes, também votaram para flexibilizar a exigência de ordem judicial, argumentando que o Marco Civil, criado há mais de dez anos, já não oferece proteção suficiente diante dos novos desafios do ambiente digital. Gilmar Mendes foi enfático ao afirmar que o artigo 19 criou um “véu de irresponsabilidade” para as plataformas, permitindo que crimes graves permaneçam online sem consequência para as empresas.
A única divergência até agora veio do ministro André Mendonça, que defendeu a constitucionalidade da regra atual e alertou para o risco de censura e sanções automáticas sem decisão judicial, especialmente em casos de opiniões políticas ou ideológicas.
A decisão do STF, que será concluída nos próximos dias, pode obrigar as big techs a aprimorar mecanismos de moderação e agir de forma mais proativa na remoção de conteúdos ilegais. Por outro lado, o debate levanta preocupações legítimas sobre eventuais excessos na limitação da liberdade de expressão e sobre a possibilidade de plataformas errarem ao decidir o que deve ou não ser removido, sem o devido contraditório judicial.
O cenário exige equilíbrio: é preciso proteger a sociedade contra crimes e abusos online, mas também garantir que o ambiente digital continue sendo espaço para o livre debate de ideias, sem riscos de censura prévia ou perseguição a opiniões conservadoras e de direita. O Brasil entra, assim, em uma nova fase do debate sobre regulação da internet, em busca de soluções que respeitem tanto a ordem jurídica quanto os valores democráticos fundamentais.